quinta-feira, 15 de maio de 2008

Devaneios de um cavalinho..

Em uma dessas estâncias, que dispendem distâncias, havia um cavalinho pensador, não como gente, mas pensador lá na sua cabecinha eqüina, talvez por obra divina, ele desenvolvera o raciocínio consciente.
Sua rotina era a de um trabalhador. Antes de nascer o sol ele já recebia as encilhas em seu lombo, seguido logo do peso de seu dono que o tratava até bem. Por este ele sentia um grande afeto, exceto quando em serviço sentia o arder de um laçaço ou das esporas cravando em sua pele. Mas como era um cavalo forte aguentava firme. Ao fim dos dias de trabalho no campo, percorrendo longas distâncias, sua recompensa era uma boa passada no paço da sangua onde matava sua sede, seguida da desencilha logo depois.
Os anos se passaram assim, ele trabalhando sempre, folgando aos dias de chuva ou quando o seu dono deixava a estância por alguns dias, e com o passar dos anos ele foi perdendo o seu vigor, mas como um cavalinho pensador ele sabia disso e dava o seu melhor, indo aos limites de sua resistência.
Um dia ele não agüentou. Caiu.
Ele sabia que seu ciclo estava acabando, ele não seria mais útil para o trabalho, talvez ficasse solto no campo para que pudesse padecer livre onde trabalhara a vida toda servindo ao homem. Talvez. Na última vez que o cavalinho pensador viu seu dono este estava em frente a casa contando as notas da última venda. O velho caminhão costurava as coxilhas carregado de pensamentos.

quarta-feira, 30 de abril de 2008

Um Jovem chamado Emerson..

Sabe aquelas pessoas cheias de amigos, sempre sorridentes mas que por uma triste ironia do destino partem cedo deixando muita tristeza? Emerson foi uma dessas pessoas. Rapaz muito educado e bem relacionado, Emerson conheceu uma menina chamada Amanda, sua vizinha, amor por conseqüência, companheirismo por escolha. Durante muitos anos os dois desfilaram juntos, nas rodas de amigos e pelas festas da cidade, mas nunca puderam desfilar dentro da casa de Amanda, que era branca, em contraponto a ele que era negro. Mas isso lá alguma vez foi motivo para impedir amor? Não, claro que não, principalmente para eles que se queriam tanto.
O tempo..
Esta palavra é mística, pois ela remete a algo que conforta, ensina mas também destrói. Depois de cerca de nove anos juntos Amanda e Emerson tiveram um desentendimento, talvez pouca coisa, talvez coisa séria, quem sabiam eram eles, mas o fato foi que se separaram. Mas isso não separou suas casas, nem tampouco diminuiu o sentimento de Emerson. Em algumas semanas o rapaz não mais podia segurar o coração dentro do peito, pois a via, e o seu abraço, sua mão para mais uma passeio, se faziam necessários. Emerson passando por cima de todos os seus sentimentos de orgulho resolveu então deixar de perder tempo, ela era sua amada, a pessoa mais importante para sua alma, além claro de pai e mãe, mas esses ocupam espaços de amor diferentes dos do que uma pessoa como Amanda ocupava em seu peito naquele momento. Emerson pensou até em pedir ajuda ao pai da menina, que apesar de censurar o amor devido a cor do rapaz poderia se sensibilizar enfim. Naquela noite Emerson viu a mão de sua namorada, de seu amor para toda a vida, junto a mão de um outro rapaz, branco, mas isso era o que menos importava naquele momento, o que machucou foi que aquela era a mão do seu amor.
Ao lado da arma que ele usou para acabar com a própria vida, estava a rosa que Amanda deveria receber com amor e retribuir com um abraço dizendo a frase que ele mais desejava, eu te amo.

terça-feira, 8 de abril de 2008

Mar de Rosas...

A anti-crônica vem guiando meus passos, depois de ler tanta besteira escrita por grandes cronistas, ou cronistas grandes, não sei precisar exatamente, resolvi que não mais escreveria, nem mesmo para o meu consumo como tem sido esse queridíssimo caderno de contos, nunca lido. Mas algo me veio a mente, algo dessas questões metafísicas, algo que me dá medo, mas que incrivelmente me faz rir, em saber como somos iguais, todos nós. Alguém diria que sou louco por afirmar essa igualdade, com que parâmetros se igualaria Bill Gates a mim, um coitado, em termos financeiros?.. E qual é minha resposta? A morte. Óh! Mas isso todo mundo sabe! Claro que todo mundo sabe, eu estou escrevendo pra mim mesmo, posso? Enfim.. Quando vivemos momentos felizes sejam eles no campo do amor (esses raros) no campo financeiro (esses suados ou conseguidos às mãos beijadas) ou no campo da amizade, a vida parece nossa, o corpo parece nosso, os pensamentos parecem ser os mais certos, e as atitudes então, corretíssimas, afinal, eles é que nos devem, o tempo todo, é o governo que erra, é o time que erra, nós nunca erramos. E é pensando nisso que quando estamos felizes por algum motivo tudo parece um mar de rosas, Azar é o deles em terem nascido na Etiópia, não é? O mundo é nosso!... Pois bem, é exatamente quando essa parte da festa acaba que nos damos conta de uma coisa, existe lá na frente uma indesejada a nossa espera, ela mesma, citada acima, a morte, que quer avise que venha, quer chegue de repente, ela vem! E aí cumpadi, descobrimos que esse processo biológico ao qual chamamos de corpo não nos pertence, que nosso pensamentos por mais bem intencionados que tenham sido não correspondem sempre ao sutil ou sensato e que nossas atitudes deixaram muito a desejar, afinal, não foi azar dos etíopes terem nascido lá não. Na hora da morte o cético vira religioso, que presunção querer virar santo no último instante, teria produzido muito mais enquanto saudável mas acontece que a vida não é um mar de rosas... Algumas aparecem mesmo depois do mar, depois da vida.

quarta-feira, 27 de fevereiro de 2008

Intrusas Imagens

Mariano era um menino absolutamente normal, com seus doze anos de idade frequentava a escola, aulas de violão e de futebol. Nas horas vagas lia revistas com histórias de ficção científica. Essas revistas eram de fato as que lhe proporcionavam o maior sentimento de tempo bem gasto. Ele as adorava. Seu pai era um médico viúvo, professor universitário e totalmente cético. Seu ceticismo o havia afastado de seu próprio pai, que vivendo os últimos dias de sua vida fora repreendido seriamente por crer em Deus, e acreditar que almas precisassem de ajuda. Para ele a morte nada mais seria do que o fim das funções biológicas, levando ao nada, ao apodrecimento de tudo o que fomos, à escuridão, enfim, ao fim.
Após gastar várias horas de sua semana lendo ficção, Mariano acabava encenando suas histórias pela casa junto com amigos, o que levava seu pai a loucura. Primeiro pelo fato de o filho parecer ser tão ingênuo a ponto de realmente crer que algo naquelas páginas pudesse ser mesmo verdade. Segundo, porque com a ajuda dos amigos o menino deixava a casa bagunçada de ponta a ponta. Mas um dia algo incomum aconteceu em uma das brincadeiras. Mariano avistara atrás de um dos sofás na sala de sua casa a mão de uma pessoa, como que se alguém ali atrás quisesse levantar e se apoiasse nele. Porém desta vez o menino brincava sozinho, e seu pai não estava em casa. A primeira reação que teve ao ver a mão foi a vontade de fugir, pois alguém havia invadido sua casa, certamente um ladrão, mas o menino era muito corajoso e resolveu tirar sua dúvida. Pulou em cima do sofá e num grito de "te peguei" constatou que não havia ninguém atrás do móvel. Correu. Correu e gritou. Quando seu pai chegou ao fim da tarde encontrou Mariano sentado em frente a casa, um pouco mais tranquilo, mas ainda assustado. Pai - disse ele - eu vi um fantasma, na sala, atrás do sofá!
Ah, um fantasma, não seria o homem de Marte que estava ali atrás segunda-feira à noite? - exclamou o pai com desdém, referindo-se à fantasia que o amigo do menino usara em sua última brincadeira.
-Não pai, eu falo sério, eu vi, sei que vi!
-Escuta aqui Mariano, eu estava trabalhando, estou cansado, então não podemos brincar agora, muito menos dessas besteiras que tu fica lendo todos os dias.
E assim o ceticismo do homem sentenciou a falta de apoio ao menino assustado. Ele estava sozinho nessa.
Após o jantar Mariano começou a pensar que de fato poderia ser alguma besteira, talvez uma ilusão de ótica e de tanto pensar acabou ficando em dúvida se realmente havia visto algo ou não. As dúvidas acabaram quando Mariano acordou de madrugada para ir ao banheiro. Meio sonolento acendeu a luz e foi surpreendido por uma imagem refletida no espelho, parecendo estar atrás dele, dessa vez era apenas um vulto, mas o bastante para ele ter certeza, algo estava acontecendo. Sabendo que seu pai o repreenderia mais uma vez o menino resolveu lidar com a situação. Fazendo uso de uma lanterna caminhou a casa toda, sentindo cada centímetro de seu corpo em arrepios, mas enfrentando o medo em busca de uma solução a este caso. Contudo nada mais viu, apenas por varar a noite em busca de explicações acabou dormindo sentado na escadaria. Seu pai o acordou com um grito pela manhã. Mariano! O que está fazendo aí? Vai se atrasar para a escola!
-Pai, é que, acontece que... eu vi de novo.
-Olha Mariano, pra mim essa história já não é mais brincadeira, tu não sabe, mas eu já tive problemas por conta dessa besteirada toda. Sabe o que eu vou fazer?
-Vai me ajudar?
-Vou, com certeza, hoje a tarde vou te buscar na escola e vamos fazer uma tomografia da tua cabeça para saber o que há de errado contigo!
-Mas pai!
-Sem mas Mariano, pode ser que depois de ver que não há nada de errado tu te dê conta de que já passou da idade de mentir para teu pai com brincadeiras dessas, ou descobrimos que realmente há algo errado contigo.
E assim foi feito.
Enquanto esperava em frente a escola o menino pensava que talvez houvesse mesmo algo errado consigo, e quem sabe seu pai o pudesse curar, pois era um neurologista.
- Nada Mariano, viu como tu não tem nada ?Agora faça o favor de se dedicar mais aos estudos e à biologia, que assim pode ser que tu entenda como as coisas de fato acontecem.
Duas semanas se passaram e o pai do menino não ouviu mais nenhuma brincadeira ou reclamação. Até o dia em que lia o jornal em frente à lareira quando seu filho chegou sorrateiro e cabisbaixo parando em sua frente. Pensando em como seu tratamento ao filho poderia ajudá-lo a ser mais sincero e dedicado optou por tratá-lo ternamente
-O que foi meu filho?
-Pai, eu vi de novo, várias vezes.
-Mariano, meu filho!
-É sério pai, e agora eu estou vendo, está ao lado do senhor, não vejo inteiro, mas um perna, com calça cinza e um sapato preto arranhado na ponta, e a mão no seu ombro, com com um anel dourado.
O homem foi aos prantos.

sábado, 26 de janeiro de 2008


Prezados Seres Humanos

Atenção! Atenção!

Habitantes do planeta terra!
Eu sou um enviado especial dos céus, vim aqui para cobrar a conta!
Há anos vocês vêm consumindo o que nãos lhes pertence, matando quem pensam estar sobre o jugo, torturando, brincando com vidas e reduzindo a nada beleza e pureza dos ciclios desse planeta. Tentamos antes algumas intervenções, primeiro vulvões, depois tornados, furacões e até ondas gigantes, mas vocês não pararam, quem são vocês? Ou melhor o que são vocês?
Seus desgraçados, filhos da... Antes eu sentia pena das crianças mas estou agora com dúvidas quanto a isso, porque vocês todos foram crianaças um dia e muitos brincando com a vida desde cedo, não é mesmo?
Caçando por esporte, e muitos depois de adulto caçam, ou pensam que não conheço suas rinhas e touradas?
Então...
Agora meus amigos, digo, meus inimigos, é hora de pagar a conta. Eu já fui piedoso antes, achei que devido a seus avanços em tecnologia os traria cada vezmais sabedoria, e o que eu vejo? Um desprezo total por quem não é vocês, por quem não tem o mesmo diploma que você ou seu maldito automóvel ou seu maldito dinheiro que sem você saber nada mais é do que seu passaporte para o porão do mundo.
Então seres desumanos, agora vocês sentirão na pele a dor a humilhação que causaram durante tanto tempo.
He He He, assustei vocês? Tudo não passa de uma brincadeira...
Acontece que não sou enviado dos céus, He He He, peguei vocês!
Sou enviado do inferno seus ordinários! Os céus desistiram de vocês, apenas acolhem as boas almas que vocês enviam as centenas diariamente.
E a propósito quanto a conta que vocês têm de pagar... continuam em dídiva, e ferrados!

terça-feira, 22 de janeiro de 2008

A Janela do Tempo...

A netinha estava eufórica. Viajar para a casa da avó era seu presente após a conclusão da primeira série da escola.
Sua mãe a colocou no ônibus das 7:00 horas, com chegada prevista na cidadezinha vizinha em torno de 9:00 horas. Precisamente, as 9:00 lá estava ela recebendo um abraço apertado da sua avó que já a esperava há mais de meia hora, que era por garantia. A senhora usava um vestido florido, longo, era magra, tinha cabelos brancos e rosto rude, mas um coração derretido pela jovem presença em seu lar com tão pouca vida e cor. O marido, que fora empregado na rede ferroviária por muitos anos havia sofrido um acidente de trabalho e não saía mais da cama. A netinha apertava forte a mão do avô, que observava o semblante gracioso da jovem com sorriso verdadeiro de dentinhos pequeninos e olhos expressivos completando a beleza do rostinho infantil, coberto por lisos cabelos castanhos que chegavam até seu ombro.
- Laurinha, deixa teu avô descançar querida, vem que a vó vai te dar um cafezinho com doce do jeito que tu gosta! - E dessa maneira os dias foram passando, com atividades diversificadas, como visita as senhoras amigas de sua avó, curso de crochê, passeios pelo parque e o auxilio que dava a velha senhora para cuidar da saúde do avô.
Numa tarde após o almoço e a limpeza da cozinha sua avó quis dormir um pouco para repor as energias.
Laurinha quis ler. A biblioteca que o avô cultivara possuía volumes que variavam entre metafísica a contos de fada. Um luxo cultivado com carinho pelo bom homem. Mas um luxo com um ar de mistério, prateleiras lotadas de livros em uma sala pouco iluminada.
A menina bastante curiosa folhava todos quantos podia até que viu uma coleção, que não sabia de que era, mas pela aparência despertou sua atenção. Dez volumes em capa dura, azuis e bem preservados, mas sem indicação do título na capa. Resolveu então tirá-los da prateleira e investigar a respeito de que o livro falava. Após tirar todos os livros Laurinha percebeu que havia uma janela escondida atrás da prateleira, que foi parcialmente mostrada com a retirada dos volumes. Ela sabia que atrás daquela parede havia uma velha peça onde sua avó guardava entulhos do dia-a-dia e que não queria que ninguém entrasse.
Curiosidade.
Tirou mais livros, revelando toda a janela, abria para fora, mas estava cadeada. Lembrou de um chaveiro que seu avô carregava sempre pendurado no cinto e que agora repousava sobre um prego ao lado da porta da cozinha. Acertou, uma das chaves era mesmo daquele cadeado. teve receio de empurrar a as folhas da janela, pois poderia derrubar algo que estivesse na salinha ao lado. Mas o fez com calma, e surpreendeu-se muito ao sentir o sol banhando seu rosto. Abriu enfim toda a janela, e viu a coisa mais impressionante que seus olhinhos já haviam visto. A rua não estava mais pavimentada, nem mesmo havia calçada em frente a casa de sua avó, o que havia era uma rua de chão batido com crianças disputando espaço em um jogo de futebol, meninos e meninas vestidos todos com roupinhas de gente grande. Olhou para a porta da biblioteca para certificar-se de que sua avó não a encontraria fazendo arte. Ao avistar um grupo de menininhas, como ela, pulou a janela para ir ao seu encontro.
A senhora acordou as 14:25, foi na cozinha, bebeu água enquanto assistia carros ritmados na rua em frente a sua casa. Caminhou até o banheiro e no caminho viu a bagunça na biblioteca, a janela aberta. Intrigou-se mas apenas fechou-a sem muitos questionamentos. Ouviu a campanhia.
pelo olho mágico viu sua velha amiga que há décadas não via pois havia partido em busca de seus parentes, após um trauma na infância quando perdeu-se. A velha senhora animou-se com a visita!
-Laura! Meu Deus que alegria em te ver!
Quando recebeu um abraço forte desta senhora
-Vó, quanta saudade da senhora!
-Que isso Laura, estou tão mais velha assim que tu?

segunda-feira, 21 de janeiro de 2008

Maldita ferida...

- Cara, por que essa tristeza? O que houve?
- Rapaz, (snif) minha namorada me largou, estou sozinho no mundo, Meu Deus!
- Que isso cara, vocês sempre se deram tão bem, a gurizada sempre apontava vocês como o casal mais duradouro e verdadeiro da turma.
- Pois é, veja como são as coisas!
-Mas e por quê ela fez uma coisa dessas? O que tu aprontou?
- Não aprontei nada, ela me deixou porque apareceu uma ferida na minha boca..
-Ah, não acredito rapaz, por causa de uma ferida?
-Sim, essa aqui, olha..
-Nossa!

-Bom, mas mesmo assim, isso não é motivo cara, que doida, por causa de uma ferida, um amor deve resistir a esses contratempos corporais!
-Mas acontece que nesse caso o furo é mais embaixo, nós sempre tivemos esse lance de confiança, um sempre colaborando e compartilhando tudo com o outro, e quando essa ferida deu as caras fiquei um pouco envergonhado e cauteloso para os beijos, porque isso dói bastante e quando enfim criei coragem de dizer a ela meu problema a complicação foi ganhando forma. Disse a ela que não passava de uma feridinha, que em breve estaria curada enquanto ela dizia que como minha namorada tinha o direito de ver, para quem sabe, poder me ajudar a curá-la, talvez conhece-sse um remédio ou sei lá. O fato foi que ela disse que eu não confiava nela, que isso não era amor, e tudo o mais de massacrante que se possa dizer a um cara apaixonado.
-Entao ela te deixou por tu não mostrar a ferida?
-Na verdade, a gente conversou e nos acertamos, resolvi que o amor não faria com que ela sentisse repulsa, mas ela me deixou mesmo quando viu a ferida.
-Bah
-É...

sexta-feira, 18 de janeiro de 2008

Meu avô me contou que...

...Sempre foi um homem muito pacífico, como seu pai, ambos pacíficos até que a discussão não terminasse em acordo. Certa feita quando ainda namorava minha avó ele foi a um baile na campanha, dos mais simples e mais tradicionais de que se possa falar, em um salão com paredes de madeira, chão batido e com o estacionamento lotado, de cavalos, claro. O dono do salão e por consequência da copa, se chamava Merêncio, homem igualmente pacífico, enquanto sóbrio, complicador quando no álcool, o que segundo meu avô era o de costume. Os amigos de meu avô tinham fama de brigões, mas todos claro, pacíficos. Dentre esses rapazes se destacava Alvarim, que não levava desaforo nenhum para casa. Por estar com minha avó, sua namorada meu avô que se chama Horizonte, fugia das confusões. Sabendo disso um amigo seu veio fazer o convite:
- Olha Horizonte, vamos embora porque daqui a pouco vai sair briga!
- Mas por que rapaz? - perguntou meu avô desacreditado na possibilidade de uma peleia devido a tranqüilidade da sala.
- Tchê, o Merêncio tá bêbado e tá inticando com todo mundo que vai lá na copa.
- Bom, eu vou te provar que não vai sair briga, vou lá na copa comprar uma branquinha! - Dito isto meu avô deixou minha avó aos cuidados do amigo e foi na tal copa com toda a tranquilidade que é uma característica sua.
Passado um tempo voltou ele um tanto alterado e disse:
- Vamos embora Rosa, que agora sim vai sair briga!
- Ah então tu concorda comigo agora Horizonte - rebateu seu amigo
- É que agora o Merêncio inventou de discutir com o Alvarim!
Dito e feito, meu avô descia a coxilha a cavalo com minha avó ao som dos facões e revolveres dentro da sala. Contou-lhe o Alvarim no outro dia, com a cabeça seqüelada da porretada que levara da filha do Merêncio, que aquele teria de achar uma boa costureira por que o número de pontos que o vivente leva para fechar um corte da orelha até o queixo não deve ser pouco.
Meu avô que é um homem pacífico assim como seus amigos, contou-me outras histórias, que aos poucos vou tentar digitalizar neste caderno dos contos.