quarta-feira, 27 de fevereiro de 2008

Intrusas Imagens

Mariano era um menino absolutamente normal, com seus doze anos de idade frequentava a escola, aulas de violão e de futebol. Nas horas vagas lia revistas com histórias de ficção científica. Essas revistas eram de fato as que lhe proporcionavam o maior sentimento de tempo bem gasto. Ele as adorava. Seu pai era um médico viúvo, professor universitário e totalmente cético. Seu ceticismo o havia afastado de seu próprio pai, que vivendo os últimos dias de sua vida fora repreendido seriamente por crer em Deus, e acreditar que almas precisassem de ajuda. Para ele a morte nada mais seria do que o fim das funções biológicas, levando ao nada, ao apodrecimento de tudo o que fomos, à escuridão, enfim, ao fim.
Após gastar várias horas de sua semana lendo ficção, Mariano acabava encenando suas histórias pela casa junto com amigos, o que levava seu pai a loucura. Primeiro pelo fato de o filho parecer ser tão ingênuo a ponto de realmente crer que algo naquelas páginas pudesse ser mesmo verdade. Segundo, porque com a ajuda dos amigos o menino deixava a casa bagunçada de ponta a ponta. Mas um dia algo incomum aconteceu em uma das brincadeiras. Mariano avistara atrás de um dos sofás na sala de sua casa a mão de uma pessoa, como que se alguém ali atrás quisesse levantar e se apoiasse nele. Porém desta vez o menino brincava sozinho, e seu pai não estava em casa. A primeira reação que teve ao ver a mão foi a vontade de fugir, pois alguém havia invadido sua casa, certamente um ladrão, mas o menino era muito corajoso e resolveu tirar sua dúvida. Pulou em cima do sofá e num grito de "te peguei" constatou que não havia ninguém atrás do móvel. Correu. Correu e gritou. Quando seu pai chegou ao fim da tarde encontrou Mariano sentado em frente a casa, um pouco mais tranquilo, mas ainda assustado. Pai - disse ele - eu vi um fantasma, na sala, atrás do sofá!
Ah, um fantasma, não seria o homem de Marte que estava ali atrás segunda-feira à noite? - exclamou o pai com desdém, referindo-se à fantasia que o amigo do menino usara em sua última brincadeira.
-Não pai, eu falo sério, eu vi, sei que vi!
-Escuta aqui Mariano, eu estava trabalhando, estou cansado, então não podemos brincar agora, muito menos dessas besteiras que tu fica lendo todos os dias.
E assim o ceticismo do homem sentenciou a falta de apoio ao menino assustado. Ele estava sozinho nessa.
Após o jantar Mariano começou a pensar que de fato poderia ser alguma besteira, talvez uma ilusão de ótica e de tanto pensar acabou ficando em dúvida se realmente havia visto algo ou não. As dúvidas acabaram quando Mariano acordou de madrugada para ir ao banheiro. Meio sonolento acendeu a luz e foi surpreendido por uma imagem refletida no espelho, parecendo estar atrás dele, dessa vez era apenas um vulto, mas o bastante para ele ter certeza, algo estava acontecendo. Sabendo que seu pai o repreenderia mais uma vez o menino resolveu lidar com a situação. Fazendo uso de uma lanterna caminhou a casa toda, sentindo cada centímetro de seu corpo em arrepios, mas enfrentando o medo em busca de uma solução a este caso. Contudo nada mais viu, apenas por varar a noite em busca de explicações acabou dormindo sentado na escadaria. Seu pai o acordou com um grito pela manhã. Mariano! O que está fazendo aí? Vai se atrasar para a escola!
-Pai, é que, acontece que... eu vi de novo.
-Olha Mariano, pra mim essa história já não é mais brincadeira, tu não sabe, mas eu já tive problemas por conta dessa besteirada toda. Sabe o que eu vou fazer?
-Vai me ajudar?
-Vou, com certeza, hoje a tarde vou te buscar na escola e vamos fazer uma tomografia da tua cabeça para saber o que há de errado contigo!
-Mas pai!
-Sem mas Mariano, pode ser que depois de ver que não há nada de errado tu te dê conta de que já passou da idade de mentir para teu pai com brincadeiras dessas, ou descobrimos que realmente há algo errado contigo.
E assim foi feito.
Enquanto esperava em frente a escola o menino pensava que talvez houvesse mesmo algo errado consigo, e quem sabe seu pai o pudesse curar, pois era um neurologista.
- Nada Mariano, viu como tu não tem nada ?Agora faça o favor de se dedicar mais aos estudos e à biologia, que assim pode ser que tu entenda como as coisas de fato acontecem.
Duas semanas se passaram e o pai do menino não ouviu mais nenhuma brincadeira ou reclamação. Até o dia em que lia o jornal em frente à lareira quando seu filho chegou sorrateiro e cabisbaixo parando em sua frente. Pensando em como seu tratamento ao filho poderia ajudá-lo a ser mais sincero e dedicado optou por tratá-lo ternamente
-O que foi meu filho?
-Pai, eu vi de novo, várias vezes.
-Mariano, meu filho!
-É sério pai, e agora eu estou vendo, está ao lado do senhor, não vejo inteiro, mas um perna, com calça cinza e um sapato preto arranhado na ponta, e a mão no seu ombro, com com um anel dourado.
O homem foi aos prantos.