segunda-feira, 31 de janeiro de 2011

O Invento da Bússula

Foi procurando o Norte que encontrei você. Lembro bem, era inverno, tremia de frio sobre meu cavalo. O campo era deveras extenso. Coisa para três ou quatro dias de jornada, que com muito empenho decidi cumprir. Naquela época ainda me encontrava ingênuo para essas questões de orientação. O único instrumento de que fazia uso então era a posição da estrela boieira, que em outras tantas madrugas surgiu no nascente para provar que me fazia o caminho certo. Naquela noite de inverno a cerração cobria o céu tirando minha humilde estrela do campo de visão. Senti-me perdido e o frio tornava a situação ainda mais incômoda, porém ao avistar-lhe pareci ter encurtado o caminho. Mais forte do que a luz do candieiro ali pendurado foi seu sorriso que me acolheu e juro, fez o que meu pobre pala não havia feito até então. Encheu-me de calor. Em seu sorriso além da luz havia algo escrito, custei a ler seus lábios e sua feição mas depois de um tempo pude perceber que o que havia ali escrito era essa palavra que sempre povoou minhas jornadas. Destino.
Ouvi dizer de um viajante de outros pagos há algum tempo que a bússola funciona através de um sistema de magnetismo que aponta sempre para o Norte. Tive certeza que meu par de esporas e meu cavalo naquela noite foram minha bússola, pois mesmo perdido de meu real caminho cheguei a você. Deste-me pouso junto a seu galpão. Seu pai muito desconfiado pediu que seu irmão fizesse ronda. O coitado pensando estar abrigando um mascate tinha dentro de seu leito a maior ladra de todas. Meu coração nunca mais fora encontrado depois da manhã em que junto a ti mateei a sombra de uma figueira que fazia frente a sua casa. Tudo que lhe rodeava me pareceu tão perfeito, até mesmo seu irmão que estafado da ronda dormia em plena hora do mate. No entanto como de um pealo caí novamente na estrada pois meu rumo e meu Destino dessa vez não foram irmãos. Naquela tarde fria ao menos o sol mostrou-me o caminho para onde originalmente me encaminhava. Quando voltei alegre, sangrando o pobre amigo que com respeito sempre levou-me onde necessário, descobri que seu coração a outro pertencia e que nem ao menos o meu poderia mais levar comigo. Dois mil anos antes de nosso Senhor. Esse é o tempo que me separa da invenção da tal da bússola. Pergunto-me se haveria nesse instrumento alguma esperança de meu rumo mais uma vez levar-me a meu Destino.